Destinos musicais: Liverpool
Há um tempo atrás, escrevi sobre cidades que têm por atração
turística a música. Na ocasião falei de Conservatória, a cidade da
seresta que fica na Mantiqueira fluminense onde já fui duas vezes.
Recentemente pude realizar um grande sonho e visitar outra cidade
fortemente ligada à música: Liverpool. Quem me conhece ou já leu meus
textos por aqui sabe o que os Beatles representam para mim. Muito mais
do que admirador, sou um beatlemaníaco, como se diz por aí. Conheci os
Beatles ainda bem novo com uma fita cassete gravada por minha tia
Rejane, a quem até hoje chamo de “culpada” por essa paixão. Foi amor à
primeira audição. Aquele som mexeu comigo de tal maneira que entrei em
um caminho sem volta.
Da fita, que se enroscou no toca-fitas de tanto uso, fui atrás dos
discos e não parei até ter a discografia completa do grupo. Esse
fascínio que os Beatles causam é difícil de explicar, mas, como vou
direi mais à frente, é algo que atravessou gerações e ainda continua
forte. Liverpool é uma cidade portuária e sempre teve importância
histórica e econômica para a Inglaterra. Hoje em dia, entretanto, a
história milenar da Inglaterra fica ofuscada pelos últimos sessenta
anos, quando aqueles rapazes se conheceram e começaram a tocar ainda
adolescentes e ganharam o mundo. Sonho de todo fã, a cidade respira
Beatles e estima-se que o turismo ligado ao quarteto injeta anualmente
na economia local um bilhão e meio de dólares.
Mais do que ser somente a cidade natal dos “quatro fabulosos”,
Liverpool tem uma relação muito estreita com a sua música. Assim, todo
beatlemaníaco quer conhecer Penny Lane e tentar entender como um tema
aparentemente corriqueiro, um dia típico de uma rua com seu barbeiro,
transeuntes e o bombeiro que limpa seu caminhão, rendeu uma canção tão
especial. Ou imaginar o que significavam as memórias daquele muro e o
portão vermelho de Strawberry Fields, um orfanato próximo à casa de John
Lennon. E na verdade não há o que se entender. São a vida e as memórias
que acompanharam os artistas. Uma vez em Liverpool pode-se conhecer as
atrações por conta própria, de ônibus ou carro, ou se encaixar em alguns
dos passeios de algumas horas que visitam esses e outros lugares, como
as casas onde os Beatles nasceram ou viveram e suas escolas. O ponto
alto da “peregrinação”, na minha opinião, é o lendário Cavern Club, o
clube associado ao começo da carreira, quando eles começaram a ficar
famosos.
No Cavern Club os Beatles tocaram por noites a fio, às vezes em mais
de uma apresentação por dia (foram 292 performances entre 1961 e 1963),
inclusive quando suas primeiras músicas já estavam estouradas no rádio e
nas vendas. A casa se tornou um ícone e, a partir de então, atraiu
shows de outros artistas que despontavam nos efervescentes anos 60. A
casa, que lembra uma cave de vinhos e fica no subterrâneo a dois andares
abaixo do nível da rua, foi desmanchada em 1973, por conta de uma obra
pública do metrô da cidade. Anos mais tarde os planos mudaram e foi
possível reconstruir o local, mantendo sua planta e reutilizando boa
parte dos tijolos originais para a felicidade dos fãs. Hoje é um bar
agitado, onde a música começa ainda de tarde e não fica sem uma banda
tocando até altas horas da noite. A plateia é a prova do que eu disse
antes: várias gerações reunidas, desde os que viveram os anos da
beatlemania até adolescentes. Em um dos dias em que estive lá fiquei
impressionado com a empolgação de um grupo de senhoras idosas que
dançaram e cantaram ao som das músicas que provavelmente embalaram sua
juventude. Em suma, é o lugar ideal para se celebrar tudo de belo que
aqueles rapazes, que um dia chocaram o mundo com suas cabeleiras,
produziram e nos deixaram de legado.
Não bastasse tudo isso, Liverpool é uma cidade
interessante e com atrações não ligadas aos Beatles como museus,
igrejas, uma bonita zona portuária revitalizada e o futebol do
tradicional time que leva o nome da cidade. De quebra, nos finais de
semana tem uma vida noturna agitadíssima e bons bares e restaurantes.
Diversão garantida e, é claro, boa música. Boa não. A melhor. “Roll up
for the mistery tour”.
(Publicado no Jornal das Lajes, dezembro de 2015)
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